25 março, 2011

Morte ou esquecimento

A vida nem sempre é justa, e faz com que aconteçam coisas de que não estamos á espera. Nestas alturas ficamos revoltado, com vontade de desistir de tudo, ficamos com vontade de esquecer tudo a nossa volta, pensando que nada vale a pena pois apesar de hoje respirarmos o amanha é-nos desconhecido.
A perda de alguém de quem gostamos é sem invariavelmente uma desilusão perante tudo aquilo que acreditamos, é um algo que nos muda e é capaz de nos tornar noutra pessoa, contudo é preciso retirarmos os ensinamentos que quem ou o quê nos quer ensinar.
Como toda a gente na vida, eu já perdi alguém, alguém mais ou menos próximo, e conheço de perto a sensação de impotência, a vontade de desistir, a ideia de atirar a toalha ao chão, mas este sentimento ainda consegue ser bem mais agreste quando a notícia trágica sobre aquela pessoa de quem tanto gostamos nos apanha desprevenidos, nessas situações é como se tudo desabasse.
Um dia, á bem pouco tempo atrás, recebi a noticia de que esse alguém tinha sido internado com uma dor que tudo indicava dor ciática, contudo, os primeiros exames realizados na semana seguinte deram o diagnostico de cancro, esse foi o momento em que toda a esperança que eu guardava caiu por terra, no entanto, conhecendo a tal pessoa tão bem mentalizei-me que se havia alguém que poderia contrariar esse diagnostico era ele, com toda a sua alegria, toda a sua força de viver, tudo aquilo que dava aos outros, tudo aquilo de que abdicava em prol de outros faziam-me acreditar que esta pessoa não poderia ter tal fim, chegando mesmo a idealizar momentos como os que vivera na sua companhia para o futuro, no entanto após algumas, não mais de meia dúzia, as noticias nunca melhoravam até que algo me fez ir visitá-lo, algo que eu ainda hoje não consigo explicar, e num sábado de manha realizei esse meu desejo.
Aproximando-me da cama hesitei, questionando-me se era mesmo aquela pessoa que eu pretendia ver, mas depois de ver aqueles olhos abrirem na minha direcção, eu não tive dúvidas, era mesmo ele, mesmo com aquele aspecto frágil, aquela imagem eu nunca vou esquecer, eu conhecia aquele olhar. Naquele par de horas em que lhe fiz companhia as palavras não e saiam, eu não conseguia perceber como era possível aquela pessoa assim. Aquela pessoa que dormia cinco horas por dia, aquela pessoa que não se sentava porque nunca estava cansada, aquela pessoa cheia de destreza estava agora confinada aquela cama, e aquela imagem partiu-me o coração. Sai do hospital com uma angústia tal que preferi não exprimir uma palavra que fosse. Voltei no dia seguinte porque as semanas são longe daqueles que gostamos e naquele dia eu senti que tinha de lhe dizer adeus.
Antes da minha viagem passei alguns minutos com ele, trocamos algumas ideias e nunca mas nunca eu vi o seu sentido de humor falhar, no entanto tive de o deixar, não só por aquele dia, não só por aquela semana, mas sim para sempre, as ultimas palavras que ele me disse com aquele tom de voz frágil que nunca esquecerei, foram, “Obrigado por teres vindo. Obrigado por tudo!”. Assim me despedi da pessoa que me fez crescer como pessoa, aquela que me acompanhou numa etapa da minha vida, a pessoa que era como um pai para mim, após dez anos como meu treinador, ele deixou-me e eu… eu não pude fazer nada.
Morreu passados cinco dias, numa sexta-feira de manha recebi a notícia, e tal como agora, as lágrimas caíram-me pelo rosto, porque ele era especial, porque ele não merecia, porque ele tinha muito para dar, porque ele era único, porque ele nunca desistiu, e eu sei que mesmo até morrer ele nunca desistiu da ideia de se curar, no entanto era algo que já estava destinado, tudo aconteceu em seis semanas, e ainda hoje me custa acreditar como alguém se transforma de tal maneira em tão pouco tempo.
Depois da sua morte, com a cabeça fria, eu superei tudo aquilo agarrando-me ao que o fazia mais feliz, o atletismo era a sua paixão e foi aí que eu me debrucei para lhe agradecer por tudo o que fez por mim, porque eu nunca tive essa oportunidade. E ainda hoje quase um ano depois da sua morte, não há um treino que faça e que não lhe agradeça por tudo.
Eu não sou mais do que ninguém, eu não tenho super poderes mentais para me fazer ter um pensamento positivo, eu simplesmente limito-me aceitar que apesar daquela perda, houveram e continuam a haver motivos para acreditar naquilo que defendemos. Aquela pessoa, fez parte da minha vida e continua a fazer, nunca ninguém o conseguirá substituir, mas ele tenha uma força de viver imensa e essa sua força é agora um motivo para eu também viver, porque eu sei que mesmo depois de nos deixar, ele não deixa de nos ensinar.
A morte de uma pessoa pode ser deveras dolorosa, mas nada há para contrariar tal acontecimento, no entanto só depende de cada um de nós decidir se apenas perdemos alguém fisicamente ou se lhe queremos acrescentar a morte dele dentro de nós.
Para mim ele morreu fisicamente mas continua a ajudar-me, eu sei que continua.

4 comentários:

  1. A forma como aceitamos a morte daqueles que são importantes depende de cada um de nós e da pessoa em si. Já lidei com a morte de várias pessoas próximas de mim e para cada uma delas reagi de forma diferente. talvez a primeira vez que passei por isso foi a derradeira, a mais forte, a que criou mais resistência porque também foi uma das maiores perdas que tive. Não deixei morrer aquela pessoa dentro de mim durante muito tempo, até ao dia em que percebi que realmente tinha que a deixar ir...

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  2. Lidar com a perda de alguém que fez parte da nossa vida é sempre muito difícil, é revoltante e inaceitável…ou difícil de aceitar. Sim, pensamos sempre que não merecia, que era uma boa pessoa e tudo mais…mas se pensamos isso é porque realmente o que sentimos. Eu já perdi pessoas muito próximas, e a única coisa que tenho a dizer é que é muito terrível cair na realidade, não é de um dia para outro, leva o seu tempo. E nunca se esquece!

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  3. Eu senti e ainda sinto essa dor, não há palavras que nos ajudem, é terrível e custa demais. Mas é como dizes, elas continuam vivas dentro de nós, pode levar bastante tempo até aceitarmos esse facto, não infelizmente não há outra opção.

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  4. a morte de alguém que amamos é indescritivel..

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